domingo, outubro 10, 2004

Jornalismo de verdade

Os principais motivos da minha felicidade desde ontem chamam-se Independent e Observer (o Guardian de domingo). A tiragem de um jornal de fim de semana num país com 60 milhões de habitantes pode ultrapassar fácil 1 milhão não apenas pelo fato de esse país ter toda sua população alfabetizada. Mas também pela qualidade do jornalismo que se produz aqui.
A diversidade de meios (o rádio é um dos mais fortes), de assuntos e de especialistas realmente preparados para tratar deles é fascinante. Você fica perdido sem saber quanto tempo vai gastar lendo jornal se não tiver o pé no chão se lembrar que tem que fazer mais coisas durante o dia.
Abaixo vão alguns exemplos do que eu falo. Coisas que gostaria de guardar e mostrar para os amigos. Coisas sobre as quais eu gostaria de passar horas discutindo...

1) O Reino Unido soube da primeira morte de um refém britânico no Iraque na sexta-feira. Desde então, pouco se fala sobre outras coisas mas cada coisa que se ouve dizer é nova, dita de uma maneira diferente. A edição do Independent de ontem dava a primeira página inteira para o assunto. Com um texto apenas. O verbo "killed" só aparece no fim do quarto parágrafo de um texto belo sem ser piegas. Como todo mundo já estava cansado de saber da morte, o texto é analítico. Apresenta o caso, mas o factual é dissolvido pela análise.

2) Além do primeiro caderno, a parte "pesada" do jornal, o Independent trouxe ontem uma revista "descolada" de cultura, com fotos lindas, um encarte de viagem superbem-feito, uma revista no estilo da "Programa" cuja matéria de capa era comer bem por menos de 25 libras e um encarte maravilhoso sobre vinhos franceses: onde comprar, com o que comer, novidades... Não vou poder passar um sábado aqui sem o Independent.

3) O Observer de hoje tem uma revista linda sobre comida, que sai mensalmente, um suplemento de artes com críticas de verdade e uma reportagem apresentando toda a nova geração de profissionais envolvidos no cinema britânico.

4) Como leitora neurótica de jornais brasileiros, me assustei ao ver na página 3 do Observer, onde esperava encontrar assuntos pesados como convenções partidárias, um texto sobre a rendição dos britânicos aos sofás dos psicanalistas.

5) Daqui a dois dias serão celebrados os 20 anos do "atentado mais audacioso" do IRA. E o Observer lembrou da data contando a história de dois personagens da tragédia. A filha de um parlamentar assassinado na ocasião e o planejador do ataque. Jo Berry se tornou uma ativista de resolução de conflitos e Patrick Magee, solto 13 anos depois da ação graças aos Acordos da Sexta-Feira Santa, faz mil elogios à filha do homem que ele matou. Os dois estão envolvidos num projeto pelo fim da violência.

6) Um livro lançado nos EUA, cujo lançamento britânico está previsto para janeiro, ganhou uma página no primeiro caderno. He's Just Not Into You: The No Excuses Guide to Dating Men é mais um livro sobre relacionamentos e previsto pra se tornar "cult" é o número dois de vendas na Amazon.

7) E a primeira matéria grande (ou grande matéria) que li aqui sobre América Latina. O sucesso do "Diários de Motocicleta" tem ajudado no crescimento da procura pela chamada "Trilha Che", na Bolívia, país onde o Che Guevara terminou heroicamente sua "campanha quixotesca", como diz o Observer. Um lide poético:

"Os camponeses dizem que se você balbuciar o nome de Che Guevara para o céu ou acender uma vela em sua memória, encontrará sua cabra ou vaca perdida. 'Se você tem fé, ele nunca falha', diz Juan Pablo Escobar."


Terça-feira tem Cidade dos Homens na BBC 4 Posted by Hello
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